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Nova embaixadora da Plan, a atriz Thainá Duarte usa sua voz para conscientizar jovens sobre relacionamentos abusivos

Tempo de leitura: 7 minutos

Nesta entrevista, a atriz de Aruanas fala da importância da sororidade e conta que quer levar a campanha #EstouAquiParaContar, sobre violência doméstica, para as escolas

Thainá Duarte sabe que tudo o que diz tem um peso especial por causa de sua visibilidade como atriz. Por isso, tem emprestado sua voz para causas que considera importantes. A campanha #EstouAquiParaContar, lançada por ela em junho, traz à tona o tema dos relacionamentos abusivos e busca chamar a atenção das meninas e mulheres sobre a prevalência desse problema, além de indicar caminhos para quem passa por essa situação difícil.

Como nova embaixadora da Plan International Brasil, Thainá deve aproveitar seu contato próximo com o público para dar mais visibilidade à causa das meninas. A atriz fortalece o time composto pelas embaixadoras Ana Paula Padrão, Joyce Ribeiro, Margareth Menezes, Astrid Fontenelle e Neivia Justa, mulheres que têm emprestado suas vozes para promover o empoderamento das meninas com a Plan.

Ao se preparar para viver a personagem Clara na série “Aruanas”, disponível no Globoplay, Thainá, de 24 anos, teve contato com diversas organizações não governamentais que trabalham com temas abordados pela série, como o ativismo ambiental, a exploração de terras indígenas e a exploração sexual infantil. Uma dessas organizações foi a Plan, que posteriormente apoiou a campanha #EstouAquiParaContar. A atriz conta que se tornou uma doadora depois de participar da experiência Estoure Sua Bolha, promovida pela Plan na Avenida Paulista em julho de 2019. “Fui nessa ação e estourei a minha bolha. Foi aí que comecei a participar.”

Nesta entrevista concedida ao nosso site, Thainá falou de sua responsabilidade em exercer uma influência positiva sobre o público, de sua infância e adolescência, de sua carreira e da mensagem que gostaria de transmitir para as meninas do Brasil.

De que maneira você se identifica com o trabalho da Plan?
O #EstouAquiParaContar é muito ligado à violência sexual que as meninas podem sofrer na infância, na adolescência e na juventude. E também a luta pela igualdade. Quando a Cynthia Betti [diretora da Plan International Brasil] falou na live que fizemos juntas sobre uma pesquisa que mostra que com 6 ou 7 anos as meninas já se veem com a possibilidade de exercerem cargos diferentes de meninos só por serem meninas, isso mexeu muito comigo. Ao longo dessa jornada, dessa parceria com a Plan, eu vou descobrir outras coisas que me mobilizam, mas a princípio foi isso.

É cada vez mais papel dos artistas levantar pautas importantes para a sociedade, como você vem fazendo em relação aos relacionamentos abusivos?
Acho que é um dever aproveitar a nossa visibilidade e o peso das coisas que a gente diz para influir de maneira positiva na vida das pessoas. Cada um carrega uma pauta simplesmente por ser o que é. Eu como uma jovem negra carrego as minhas pautas. Outras pessoas carregam consigo outras pautas.

A gente é muito ouvido, o que a gente fala tem muita relevância, querendo ou não. E se você é omisso às questões que estão acontecendo na atualidade, então está concordando com que aquilo continue. Acho que é uma obrigação defender essas pautas e dar visibilidade às pessoas que precisam.

Você entrou em contato com a questão dos relacionamentos abusivos principalmente pela história de uma de suas personagens, a Clara. Pode falar sobre isso?
“Aruanas” trata de temas muito caros à sociedade, entre eles o relacionamento abusivo. No estudo da personagem, a gente vai se familiarizando com essas questões e não tem como não se sensibilizar enquanto mulher.

Eu realmente me coloquei no lugar dela. São várias cenas com esse namorado que a persegue, até chegar a um depoimento, que foi uma das cenas que usei como ponto de partida para o #EstouAquiParaContar.

Estava tão carregada dessas emoções, do quanto um relacionamento abusivo pode te subtrair como indivíduo, que quando chegou o momento desse texto, falei para a autora: tem alguma coisa que me transpassou dessa personagem que eu preciso colocar no texto. Muito generosos, a Estela Renner e o Marcos Nisti me deixaram contribuir para a escrita dessa cena que foi tão significativa.

É a voz de muitas mulheres. Então quando a Clara fala, por exemplo – “se ele subtrai tudo o que vem de você como se não tivesse a mínima importância” – a Estela, quando escreveu isso, pesquisou muitas mulheres que tinham passado por essa situação.

Acho que por ter sido tão bem pensado, e por ter levado em conta tantos pontos de vista diferentes sobre o mesmo tema, foi que se chegou a um texto que bate no coração de todas as mulheres. Todas as mulheres que resolveram participar do projeto ouviram o texto da Clara e se sensibilizaram pela mensagem. Elas disseram: ‘poderia ser eu falando isso’.

O que a fez trazer esse tema para fora da série e criar o projeto?
A série foi primeiro para o Globoplay e comecei a receber mensagens de meninas muito jovens relatando relacionamentos abusivos que tinham vivido ou estavam vivendo. Me incomodou muito o fato de que eu não sabia dar o direcionamento correto a elas. Quando a série foi para a televisão aberta, comecei a receber outras histórias e relatos.

Até que uma amiga muito próxima da família foi agredida pelo ex-companheiro e levou sete facadas. Fui perguntar a ela se eu poderia contar sua história quando me perguntassem em alguma entrevista se eu já tinha sofrido um relacionamento abusivo. Porque eu precisava contar uma história real que fizesse jus a essa mensagem para que as pessoas entendessem a gravidade de um relacionamento abusivo. A minha personagem deu muita sorte, ela conseguiu sair da situação. Ela tem uma história de superação. Mas tem muitas mulheres que não, que acabam sendo vítimas de feminicídio.

Então a Taina (ela também se chama Thainá) falou: não só pode contar minha história, mas pode usar meu nome e, se for preciso, eu quero falar nesse projeto. Foi aí que eu entendi que eu precisava usar essa cena para ampliar a voz dessas meninas. E eu resolvi criar o #EstouAquiParaContar.

Esse projeto se funda na crença de que histórias podem salvar histórias. Essas mulheres que já passaram por situações de violência doméstica podem prevenir que outras jovens e outras mulheres entrem em situações de violência. Pode ser que outras mulheres ouvindo esses relatos fiquem atentas a esses primeiros sinais.

Como tem sido a resposta a esse projeto?
Muitas mulheres têm compartilhado suas histórias e muitas ainda estão em situação de violência ou têm uma amiga passando por uma situação e não sabem como ajudar. E esse foi um dos motivos da criação do projeto: eu precisava saber dar o encaminhamento correto para essas mulheres. Foi por isso que fui atrás de tantas organizações como o Instituto Maria da Penha, a Plan, a Anistia Internacional, a ONU Mulheres.

O #EstouAquiParaContar criou vida própria e acredito que a gente vai criar outros tipos de conteúdo com um enfoque mais amplo, sobre relacionamentos saudáveis. Tem muitas mulheres que ainda precisam ser ajudadas.

Acredito que continuar o conteúdo falando com jovens vai ser a nossa salvação. Uma pessoa mais velha dificilmente mudará como pensa. Mas com o jovem, a gente realmente tem a capacidade de mudar sua cabeça e mudar o futuro. Vamos ver se quando acabar a pandemia a gente consegue levar o #EstouAquiParaContar de maneira mais leve para as escolas, para que entre na grade falar sobre violência doméstica e relacionamentos saudáveis.

Quando você era menina, em algum momento sentiu que teve oportunidades diferentes do que os meninos?
Dentro de casa, a minha mãe sempre prezou, por exemplo, para que meu irmão e eu fizéssemos as mesmas tarefas domésticas. A gente sabe fazer as mesmas coisas, mas a cobrança é muito maior em mim. Se eu não faço as coisas, as coisas não acontecem.

Na escola, os professores muitas vezes não respeitam as coisas que você tem para perguntar. Existe um clima de poder na sala de aula entre meninos e meninas e as meninas ficam meio à mercê daquilo que os meninos decidem que vai acontecer.

Além disso, a gente é ensinada a ser cuidadosa, não só cuidar das coisas da casa, mas cuidar da família e do lar para que a convivência seja boa. Quando esse tipo de desigualdade acontece dentro de casa entre irmãos, as meninas são ensinadas que devem prezar pelo bem do lar. Por isso, a gente às vezes se vê obrigada a aceitar.

Você pode falar um pouco sobre sua história?
Cresci em São Paulo. Sou adotada e moro com minha família adotiva. Tenho um irmão mais velho e duas irmãs que não moraram comigo. Uma das minhas irmãs passou alguns períodos da vida com a gente e teve uma infância muito difícil. Mas aqui em casa pelo menos a gente é muito privilegiado. Eu e meu irmão estudamos em colégio particular, tivemos uma boa educação em casa, uma mãe que sempre fez tudo para que não faltasse nada.

Minha adolescência, como acho que toda adolescência, foi bem difícil. No Ensino Médio, foi um momento em que eu me percebi vivendo algum tipo de diferenciação dentro de escola, que era majoritariamente de pessoas brancas. Fui percebendo que aquilo não dizia muito respeito à maneira como eu era ou me posicionava, mas sobre como eles me viam. Esse momento foi bem difícil para mim e para meu irmão também porque ele era obeso.

Com 13 anos, comecei a estudar teatro porque eu era muito comunicativa e comecei a fazer testes com 15 anos. Com 17 anos, chegou a época do vestibular. Estava meio descrente porque os testes não tinham dado em nada. Resolvi que tinha que fazer outra coisa e prestei engenharia. Passei em engenharia na Universidade Federal de São Paulo e fui fazer.

Tinha feito o que seria meu último teste como atriz para o filme Mundo Cão. Foi quando eu passei no meu primeiro projeto e fui fazer meu primeiro longa, que era com a Adriana Esteves, o Lázaro Ramos, o Babu Santana. Foi uma experiência muito incrível para mostrar que o meu caminho era aquele.

Em uma entrevista anterior, você falou sobre a importância da sororidade. Para você, o que é sororidade
Isso é uma coisa que a gente vai aprendendo com o tempo, a importância de uma mulher dar a mão para outra e a beleza desse ato.

Quando eu reproduzi esse tipo de comportamento foi com a minha irmã. De entender as suas dificuldades quando ela era menina e veio morar com a gente. Eu me coloquei muito no lugar dela e me coloco até hoje, de uma pessoa que viveu muitas violências na vida. Tento mostrar uma possibilidade de mundo diferente para ela.

Um dos momentos em que eu acho que o universo me retribuiu isso foi em “Aruanas”, que tem quatro protagonistas mulheres. Nesse trabalho, foi muito forte estar em contato com elas – Taís Araújo, Débora Falabella, Leandra Leal e Camila Pitanga – e ver essas mulheres me apoiando como uma jovem que está começando e me dando a mão. Me senti muito bem, fui muito abraçada por todas e cada uma me ensinou uma coisa diferente.

Qual a mensagem que você gostaria de passar para as meninas?
É muito difícil a gente entender o que nos move, o que nos faz feliz. Escolher a profissão, por exemplo. Mas que elas não desistam de procurar o que as motiva e, quando encontrarem, não desistam de perseguir esse objetivo. E que não deixem de dar a mão uma para a outra. Não deixem de ajudar uma mulher quando puderem, para a gente se fortalecer sempre.

Tem um vídeo do #EstouAquiParaContar que fala sobre o romper do ciclo em que as mulheres passam mensagens para meninas mais jovens. Eu pergunto a elas: O que você diria para você mais jovem? E eu faço das palavras delas as minhas. Tem uma que fala: “O que eu diria para mim mais jovem? Acredite. Não desista.” É isso.