NOTA PÚBLICA
Sem igualdade de gênero, não há desenvolvimento sustentável
Sobre a retirada da “incorporação da perspectiva de gênero” na MP 696/2015
A Câmara dos Deputados, por 188 votos contra 166, retirou, no dia 18/02, a “incorporação da perspectiva de gênero” da MP 696/2015 na seção sobre as diretrizes do Ministério das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos. Isso quer dizer que as políticas do novo Ministério não podem ser baseadas e inspiradas na igualdade de gênero.
Este voto contradiz de forma evidente e preocupante o compromisso assumido em nível internacional pelo Estado Brasileiro em Setembro 2015, com a assinatura dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que têm um dos seus pilares fundamentais na Igualdade de Gênero e no Empoderamento de Meninas e Mulheres (Objetivo 5).
Ao suprimir a expressão “perspectiva de gênero” da definição das funções de um Ministério que tem como principal função garantir os direitos humanos das populações historicamente negligenciadas no Brasil, a Câmara dos Deputados nega que as questões de gênero estejam na raiz das desigualdades históricas entre homens e mulheres.
Os dados mostram evidências disso. Com base na pesquisa “Por Ser Menina” da Plan International Brasil, publicada em 2014, cerca de 70% das meninas brasileiras, simplesmente por terem nascido meninas, têm que limpar a casa e fazer comida, enquanto só 11% dos meninos fazem o mesmo, tendo mais tempo livre para brincar e estudar. Não por acaso, 93% das crianças e adolescentes que realizam trabalho doméstico em casa de outros é menina. Aquelas mulheres que trabalham, independente de qualificação, ganham em media um salário 30% menor que seus pares homens. Na Câmara de Deputados, só tem 45 mulheres contra 468 homens, menos de 10% do total. Tudo isso é inegável fruto de históricas desigualdades de gênero.
Da mesma forma, é impossível discutir a violência doméstica e o abuso e exploração sexual, cujas vítimas são principalmente mulheres e meninas, sem discutir os papéis de gênero. Meninas lésbicas e meninos gays são alvos de piadas, hostilidades, exclusão e violência nas escolas e comunidades de todo o Brasil.
Negar a possibilidade que o Ministério das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos possa desenhar suas ações numa perspectiva de gênero significa fechar os olhos para essas realidades. Em nota pública, o mesmo Ministério lamentou profundamente esta decisão.
Acreditamos que este voto da Câmara seja fruto de instrumentalizações perigosas e de uma profunda desinformação sobre o conceito de “igualdade de gênero”. Por isso, nós apelamos à sensibilidade de todas e todos os Deputados para que revisem quanto antes esta decisão.
A perspectiva da igualdade de gênero é fundamental para que possamos acabar com discriminações, faltas de oportunidades e violência contra meninas, mulheres e população LGBT e para que todas e todos possam ter os mesmos direitos e oportunidades, “sem distinções de qualquer natureza”, como preconiza a nossa Constituição Federal.