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A VOLTA POR CIMA DE VAL

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Em diversos cantos do Brasil, a pobreza, a falta de oportunidades de brincar, a ausência de saneamento básico, o ensino ruim e a fome tiram a chance de milhares de crianças terem uma infância digna e sonharem com um futuro melhor.

Milhares de crianças que, em relatórios oficiais, são número, estatísticas, gráficos ora ascendentes, ora descendentes. Mas essas crianças são mais que isso. Elas também têm nome. Também têm uma história. E o nome e o sobrenome de uma dessas crianças, privadas de uma infância feliz, é Valdirene.

Natural da pequena Vila Matinha, no interior do Pará, Val, como é chamada pelos familiares e amigos, foi obrigada a conviver com a falta desde pequena. A falta de uma escola com uma biblioteca para estudar, a falta de ruas com uma iluminação segura que a protegesse ao sair de casa à noite, a falta de uma simples toalha para se secar após um banho. O resultado de tantas faltas foi que, aos 7 anos, a menina não sabia, por exemplo, quais eram as letras do alfabeto e, aos oito, ainda não conseguia escrever o próprio nome. Passava os dias vagando pelas ruas com os irmãos sem fazer nada e só voltava para casa à noite, quando encontrava o pai, que havia acabado de chegar do trabalho. A mãe falecera quando ela tinha apenas dois anos.

Mas Val era uma criança cheia de sonhos. Ou melhor, tinha claramente dois sonhos: se libertar, daquela pobreza e ver um avião de perto. Foi então que sua tia, que morava em São Luís (Maranhão), foi até os rincões do Pará e a convidou para ir morar em sua casa. Queria oferecer uma vida mais digna à menina e possibilidades de um futuro mais feliz, afinal, ela sabia que, caso a deixasse ali, Val poderia ter o mesmo destino de muitas meninas de Vila Matinha: engravidar ainda na adolescência e se casar antes mesmo de completar 18 anos.

“Quando eu cheguei a São Luís, meu foco era ver um avião de perto. Era o que eu mais queria. Mas eu descobri muito mais do que isso. Eu entrei na cidade e vi um monte de luzes nos postes, eu nunca havia visto aquilo antes e fiquei muito feliz. Fiquei encantada quando cheguei à casa da minha tia e tinha uma televisão, tinha energia elétrica. No dia seguinte, ela já me matriculou na escola. E ali foi outra descoberta: havia muitos livros, uma biblioteca, muita gente para me ajudar a aprender. A professora me ensinou meu nome e a ler e escrever tudo. Foi uma grande vitória. Qualquer papelzinho ou placa que eu encontrava, eu queria ler. Eu descobri que amo ler e escrever”, relembra a jovem, hoje com 19 anos.

Mas essas descobertas seriam apenas as primeiras novidades de uma nova fase em sua vida. Aos poucos, Val conheceria mais pessoas que a ensinariam, teria contato com outras realidades até então afastadas do seu mundo, se envolveria em discussões para melhorar a sua vida e a de outras pessoas ao seu redor. E conheceria as educadoras da Plan International Brasil, que também a ajudariam a escrever um novo capítulo de sua história.

O ENCONTRO COM A PLAN

Embora já tivesse ouvido as amigas falarem da ONG, o primeiro contato direto com a Plan foi quando estava na escola e uma educadora da instituição passou para falar sobre o projeto Escola de Liderança para Meninas, que seria desenvolvido na cidade. De cara, Val se interessou pela proposta, preencheu todas as fichas e, para sua surpresa e felicidade, foi uma das selecionadas para participar.

Com os encontros, a iniciativa tinha como objetivo principal empoderar as meninas para que elas reconhecessem o seu papel e o seu poder na estrutura social, lutando contra as violências e desigualdades e batalhando por lugares de liderança, onde o gênero não foi fosse um fator impeditivo para a ascensão social. Desejava mostrar às alunas que o fato de elas serem meninas não deveria ser um empecilho para nada.

Desde as primeiras rodadas de discussão, Val se identificou com o propósito da Plan e passou a admirar, cada vez mais, os seus princípios. “Eu acho muito injusto as mulheres serem privadas de algo. Ninguém deve se limitar porque a sociedade impôs isso. Se uma mulher quer fazer algo, deve fazer. É o caso de futebol. Se a menina gosta, qual o problema de jogar? Chega de pensar que isso é esporte de menino. Estar na Plan e ter contato com gente que também pensa assim me motiva a ir além e quebrar barreiras”, revela a jovem.O contato com essas pautas aconteceu por meio de uma série de exercícios e reflexões que a encheram de informações e argumentos para conversar sobre esse tema com sua família e com suas amigas. Aos poucos, Val foi se tornando uma agente multiplicadora, uma peça-chave para que mais gente entrasse em contato com a temática.

Como tinha habilidade e interesse em falar em público, também foi chamada para apresentar em eventos os projetos que o grupo fazia. Um dos encontros que mais a marcaram foi em Codó, no interior do Maranhão, onde ela foi, juntamente com outra adolescente de São Luís, compartilhar as experiências do programa em sua cidade com outros participantes da Escola de Liderança para Meninas. Conhecer novas histórias, descobrir a luta de mais mulheres e ver outras jovens que viviam situações semelhantes às suas, mesmo morando em cidades diferentes, foi um dos seus momentos preferidos na Ong. “Eu acho que, por mais que eu já tivesse esses pensamentos sobre os direitos das mulheres dentro de mim, eu não teria enxergado todos os lados, não teria tido essa visão tão completa, se eu não tivesse participado das iniciativas da Plan e feito essa viagem a Codó”, acredita.

PLANTANDO NOVAS SEMENTES

Hoje, Val já completou sua participação no projeto da Plan. No entanto, frequentemente é convidada pelos educadores para palestrar para novos alunos e compartilhar suas experiências no programa. Em sua comunidade, se tornou uma referência sobre empoderamento feminino, sendo consultada por amigas sempre que essas estão em situações delicadas. É uma voz inspiradora.

Ela revela que integrar esse projeto da Ong também fez com que acreditasse e sonhasse com um futuro melhor. Se quando veio do Pará para o Maranhão ela tinha apenas o desejo de sair da miséria e de conhecer o avião, hoje há a vontade de cursar uma faculdade de Assistência Social e modificar o mundo onde vive. No final deste ano, Val presta o Enem para tentar ingressar no Ensino Superior. Como essa mudança aconteceu e esses novos horizontes se abriram? Ela diz que muito por ter sido incentivada a acreditar em si, a lutar para ser uma mulher empoderada, a ter dentro de si o que precisa para trilhar os caminhos que deseja seguir – e tudo isso graças às conversas com os educadores da Plan.

“Me achei nessa Ong. Conheci pessoas com interesses idênticos ao meu, uma diversidade de pensamentos, gente que lutava pelas mesmas batalhas que enfrento. Me senti aceita e percebi que não estava sozinha. Foi um projeto que mudou minha vida. Hoje, eu me sinto ainda mais forte para enfrentar qualquer problema e qualquer injustiça com que eu me deparar”, finaliza.

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